sábado, 21 de abril de 2012

Terrorismo político: uma chaga contemporânea





Por Modesto Neto

“Que caminhos você vai e volta? Aonde você nunca vai? Em que esquinas você nunca para? A que horas você nunca saí? Há quanto tempo você sente medo? Quantos amigos você já perdeu? Entrincheirado vivendo em segredo, ainda diz que não é problema seu. A vida já não é mais vida, no caos ninguém é cidadão, as promessas foram esquecidas, não há estado, não há mais nação. Vivemos em tempos de guerra, rezando por dias de paz, você não vê que a sua vida aqui se encerra com uma nota curta nos jornais. Vivo sem saber até onde estou vivo, sem saber o calibre do perigo, eu não da onde vem o tiro” (O Calibre – Paralamas do Sucesso)

Democracia: um estado de coisas, um principio, ideal, valor ou um modelo de governo? O certo é que para que ela – a democracia – possa existir tanto quanto exercício tomado pelo cidadão ou como uma forma a ser utilizado na maquinaria política do Estado é preciso que a violência não seja uma constante nos espaços da real construção democrática. Se o solo é marcado por violência não se plantará democracia na terra infecunda.

O certo é que o terrorismo político é uma verdadeira chaga que se acomete em vários lugares e de diferentes formas. Este mau se manifesta das mais variadas maneiras. Na ilha do Sri Lanka até certo tempo pacifica passou a viver a efervescência que o terror no campo político traz, mesmo com tradições tão notoriamente pacifistas. Com uma população composta por cingaleses e uma minoria tâmil tendo como principais religiões o budismo e o hinduísmo a pequena ilha passou a viver um drama logo após o seu processo de independência onde o país viveu transformações consideradas positivas, apesar de nos dias atuais passar por sérios problemas com a guerra civil e contabilizar na sua história recente, tentativas de assassinatos a presidentes eleitos pelo voto popular e direto.

Falar do Sri Lanka ou dos casos de terrorismo no Oriente Médio é algo aparentemente distante da nossa realidade e embora alguns pensem que o terrorismo político é pratica longínqua das nossas vidas, eis um ledo engano.

O terrorismo político é coisa viva, verdadeira e assustadora. Tal pratica consiste no uso do terror com fins exclusivamente voltados para a manutenção ou conquista de um poder que não se viabiliza pela via popular, através do voto, da escolha livre e democrática. A conquista desse poder não pode ser considerada nem mesmo conquista já que é um assalto aos verdadeiros donatários do poder: o povo, já que o poder deve existir a partir do povo, para o povo e com o povo. Este povo é sistematicamente acossado, perseguido, caçado, entrincheirado e tratado como gado, diminuído em sua dignidade tendo seus direitos humanos mais fundamentais violentados.

Segundo essa concepção aqui grosseiramente construída sobre terrorismo político não devemos ver este terrorismo apenas no caso do Sri Lanka onde um grupo de extermínio assassinou uma presidenta eleita pelo voto direto. No Brasil os 21 anos negros da Ditadura Militar (1964 - 1985) foi uma forma institucional de praticar homicídios, torturas e desaparecimento de estudantes, intelectuais, artistas e todo e qualquer elemento que se opôs a política do cerceamento a liberdade. Neste caso o terrorismo estava no aparelho do Estado, na estrutura do país contaminada pelo autoritarismo militar.

Hoje chegamos ao século XXI e a democracia no Brasil embora jovem já mostre suas feições populares seja nas eleições elegendo um operário para a Presidência da República ou nos movimentos sociais com uma pauta efervescente de lutas e embates no campo político, seja pela redução da jornada de trabalho ou pelos 10% do PIB para a educação, nas Centrais Sindicais ou nas entidades estudantis como a UNE, o Brasil voltou a respirar liberdade. Seria então o terrorismo político uma página virada na história contemporânea do país? Também creio que não.

Apesar de todos os avanços no campo econômico e social nos últimos 20 anos o nosso país ainda vivencia uma cultura de violência e cerceamento a liberdade. Isto para nós é terrorismo político. Este terrorismo por sua vez existe quando professores da maior metrópole da América Latina (São Paulo) são repreendidos, agredidos e tratados como criminosos por reivindicarem aumento salarial. Nas fazendas onde o trabalho escravo ainda é uma dura realidade ou nos grandes centros urbanos onde o trabalho infantil marca os cenários das cidades. Estes homens, mulheres e crianças privadas de seus direitos fundamentais agem sob a influência dos seus patrões e muitas vezes nas eleições o seu querer, vontade e ideias são suplantados pela necessidade da sobrevivência assim como os coronéis do Nordeste brasileiro no final do século XIX faziam com seus trabalhadores. Terrorismo também é voto de cabestro.

Por fim precisamos ter a consciência que o terrorismo político seja através do voto de cabestro ou das ameaças que os “poderosos” fazem sobre os mais humildes é uma realidade dura que existe e precisa ser enfrentada. Uma chaga contemporânea cuja única cura é o enfrentamento tenaz do autoritarismo com a possibilidade de emancipação do povo que a partir de sua independência verdadeiramente assegurada passaria a escrever com a própria mão sua própria história.

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