sexta-feira, 8 de junho de 2012

Saudações a quem tem coragem!


DIÁLOGO SOCIALISTAwww.dialogosocialista.wordpress.com

Por Modesto Neto

"Agitador, sim! Como é possível conceber a vida sem agitação? Porque o vento agita a planta, o pólen se une ao pólen de onde nasce o fruto e se abotoa a espiga em que amadurece nas searas. O gameto masculino busca o óvulo porque há uma cauda que o agita. Se o coração não se agita, o sangue não circula e a vida se apaga. O que dizer da bandeira que se hasteia ao mastro e não se agita? É uma bandeira morta.

Qual é, por excelência, o mérito tão grande de Bartolomeu de Las Casas? Haver agitado de maneira tão extraordinária o problema do índio durante sua larga e fecunda existência. É agitando que se transforma a vida, o homem, a sociedade, o mundo.

Quem nega a agitação, nega as leis da natureza, a dialética, a ciência, a justiça, a verdade, a si próprio. O crime não está em agitar, mas em permanecer imóvel”.
(Cambão: A face oculta do Brasil – Francisco Julião)

É agitando que se transforma a sociedade, o homem, o mundo. O ex-deputado e advogado político das Ligas Camponesas, Francisco Julião, nos emociona não apenas com os discursos em defesa da terra para todos, mas nas palavras que nos legou através das obras que escreveu. Quando penso na figura que foi o Francisco Julião automaticamente o que me vêem a cabeça é um sentimento de questionamento da ordem, do sistema, das coisas como são dadas no mundo. Caviar, champanhe e frutos do mar para alguns poucos e farinha com água para muitos. Questionar essa ordem é a cara do Francisco Julião.

Agitar é viver apresentando ao universo a sua versão do mundo e foi vivendo dessa forma que homens como Darcy Ribeiro, Francisco Julião, Prestes, Brizola, Martin Luther King, Ernesto Guevara e tantos outros fizeram história em seus países. Além destes, muitos outros anônimos também fizeram história.

Na China em 1989 os estudantes, trabalhadores e intelectuais que questionavam a corrupção e a censura do sistema político foram massacrados na Praça Celestial na cidade de Pequim. No Brasil muitos foram aqueles que tiveram suas vidas ceifadas pela navalha sangrenta do Regime Militar (1964-1985), quantos pais não puderam rever seus filhos, quantas mães choraram por aqueles que foram desaparecidos, mortos, torturados. Quantas vidas foram tragadas por lutarem por liberdade? Estes também escreveram com sangue, lagrimas e suor a história de nossa pátria. Escreveram com bravura e com a convicção que seus sonhos poderiam ser realidade, como diz o poeta Victor Hugo: “utopia hoje, carne e osso amanhã”.

O que não se fala muitas vezes é que é preciso coragem. Na maioria das vezes o que é preciso é muita coragem. Eu, particularmente me recordo de três brigas que tive no ensino fundamental quando este pacifista aqui se tornava mesmo que momentaneamente um combatente, não muito forte, nem muito ágil, apenas um guri de óculos, magrelo e com ausência nítida de músculos.

Briguei três vezes quando estudava na Escola Estadual Professor Francisco Veras. Ela é uma escola pública da cidade de Angicos, no Rio Grande do Norte. Minha cidade tem hoje coisa de 12 mil habitantes, na época (há quase uma década) a população ainda era menor do que hoje. Briguei, apanhei e ainda fiquei de castigo e o mais engraçado: disso eu me orgulho.

As três vezes que dei minha cara a tapa foi em três episódios diferentes. Briguei e apanhei de um menino que estava sendo inoportuno com a menina que eu era apaixonado na época. Eu chamei ele para a briga e apanhei. Tudo bem, nele pelo menos eu bati um pouco. Na segunda vez que me meti numa briga – essa é a que eu mais me orgulho – lembro-me que um grupo de rapazes estavam batendo em um amigo meu. Não contei duas vezes nem pensei, entrei na briga para dividir os tapas. Eles eram bem maiores, bem mais fortes e estavam em vantagem numérica. Apanhamos juntos. Hoje eu vejo que isso é hombridade, na época eu não fazia a mínima idéia do que estava fazendo. Segui um instinto.

Na terceira vez foi apenas uma discussão verbal. Eu havia sofrido um pênalti num jogo treino do pessoal da escola sob o comando do saudoso técnico Aurélio Barbalho e tinha me machucado feio. Não conseguia ficar em pé, mas queria bater o pênalti. Eu sei hoje que eu estava sendo inconseqüente, mas me orgulho da rebeldia e da convicção. Eu fui injustiçado, tinha driblado o goleiro (mesmo sendo um dos maiores pernas de pau da escola) e não teria o direito de cobrar o pênalti? Lutei por esse direito, conquistei e converti o chute ao gol. Resultado: um mês sem andar direito.

Esses fatos da minha infância são apenas para dizer que eu não fazia a mínima idéia do que estava fazendo, mas nestes três eventos eu comprei a briga, o desgaste e assumi a minha responsabilidade com coragem de querer vencer. Lutei pelo que amei (pensava que amava), defendi um amigo e briguei por justiça. Eu era bom e justo como hoje não sou, isso porque as crianças são divinas e verdadeiras, diferente da grande maioria dos adultos preocupados de mais em ganhar dinheiro em vez de acreditar em ideais ou se incomodarem com os problemas e as dificuldades de outros. Vivemos o império do individualismo e é preciso coragem para derrubá-lo.

No Brasil na década de 1960 quando o regime ditatorial calou a voz de muitos estudantes que lutavam por reformas de base e trancafiou sobre sete chaves os sonhos de um Novo Brasil que era proposto pelo presidente João Goulart e impulsionado pela força de Leonel Brizola. Perdemos a luta, mas não perdemos a batalha. Nada de lamber as feridas, nossas quedas são importantes para nos levantarmos e lutar pelo que queremos.

O que em certa medida nos deixa triste é que nós da geração de 90, finalzinho do século XX, temos uma nostalgia porque não vivenciamos o bom combate dos nãos de chumbo, Quantos entregaram suas vidas a luta pelo Brasil. Enquanto historiador tenho um desejo investigativo bastante profundo e nas várias conversas que tive pude perceber que havia um engajamento político da sociedade realmente comprometida. Estudantes que trabalhavam duro em vários lugares e doavam parte significativa de seu dinheiro para imprimir folhetos, pagar passagem de amigos e financiar – muitas vezes – a fuga de companheiros caçados pela policia política. Dividir um almoço ou simplesmente um pão. Repartir a miséria é um ato de grandeza que nos falta no cotidiano. Sinto falta do que ainda não vivi, assim definiria Renato Russo. É assim que me sinto.

Nesta semana fiz uma doação de cinqüenta reais (era o que eu tinha) para que o Diretório Municipal do meu partido (o PDT) pudesse junto com a grana de outros companheiros contratar um contador e junto a Receita Federal pedir o CNPJ. Contribuir com a organização interna de meu partido não é um ato de caridade, antes de tudo é uma obrigação. Muito embora vários quadros questionem a minha agremiação eu ainda enxergo nela a caneta pela qual eu quero escrever a história do meu Brasil. E essa escrita precisa ser feita por várias mãos. É uma construção constante e coletiva. Sinto falta disso, porque eu me envergonho sinceramente porque o que eu faço é muito pouco e me envergonho muito mais porque a grande maioria das pessoas nada fazem.

Não fazer nada é um erro.  Francisco Julião diria que “o crime não está em agitar, mas em permanecer imóvel” e isto é uma verdade inconteste, ficar parado diante das injustiças é um crime. Não um crime contra a Constituição, mas um crime contra si mesmo e contra a humanidade que carece de humanidade.

Mais de dez anos depois da minha infância no ensino médio e das lutas e brigas que protagonizei, eu tenho a honra e o prazer de ter sido eleito para o Diretório Nacional da Juventude Socialista, neste mês de junho em Fortaleza/CE quando realizou-se o nosso 15º Congresso Nacional. O congresso de uma juventude que tem 32 anos de lutas, vitórias, conquistas de uma longa estrada percorrida com coragem e fé no Brasil. É preciso saudar a cada um que quer mudanças porque é preciso inundar esse país de mentes esclarecidas como diria Brizola.

Como eu já falei não é cruzando os braços que iremos mudar o mundo. É agitando que se transforma e não se sacode o mundo sem coragem. Saudações a quem tem coragem! Talvez  a luta não resulte na vitória, mas não lutar é o maior dos fracassos.


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